Um mundo desconhecido
Richard descobrira, naquela tarde de domingo, um tesouro que jamais imaginara existir.
Juliana, sua colega de turma, o convidara na sexta-feira, ao saírem do colégio, para irem até a sua casa no domingo para concluírem o trabalho de Biologia juntamente com Paula e Gabi. A casa de Juliana era quase um palácio. Nunca Richard havia entrado numa casa tão grande e tão cheia de novidades. Eram portas que se abriam ao comando de uma voz, telefones sem fio em que se via com quem estava falando, um computador que permite falar com outras pessoas do outro lado do mundo e ver o que elas estão fazendo... Mais parecia um daqueles desenhos animados de Jeannie é um gênio. Era uma coisa chamada internet e Richard ficou maravilhado com a possibilidade de conversar com pessoas em Portugal, por exemplo, como se estivessem ali, com ele na sala. Só tinha um problema: era que se a outra pessoa não falasse português, ele não podia conversar pois não falava nenhum outro idioma. Juliana lhe contara que já tinha ido para Alemanha, Suécia, Inglaterra, França, Itália, Polônia... Ele nunca tinha saído dali de Sapucaia, cidadezinha do interior do Pará com pouco mais de 5 mil habitantes. Ele às vezes até duvidava que tivesse tanta gente assim ali mas, como tinha aprendido na aula de Geografia, Sapucaia era uma cidade importante do norte do Brasil.
Richard era muito inteligente e, todos os colegas disputavam entre si, para que ele participasse da equipe, quando tinham algum trabalho em grupo para fazer. Era garantia de que teriam uma boa nota. Até aquela última semana Juliana nunca lhe dera atenção. Mas naquele domingo, Richard não pensava em estudar. Queria descobrir e desfrutar aquele mundo encantado da casa da colega. Paula e Gabi também estavam sem fala. Parecia até que tinham entrado no camarim de Luan Santana e estavam a sós com ele.
Richard começou a conversar com Michele, uma garota francesa que falava português muito bem e que já tinha passado dois anos no Brasil fazendo um curso. Ela tinha 25 anos e era mais velha que Richard 10 anos. Richard pretendia fazer vestibular para medicina. Queria ajudar a salvar as crianças que ele via morrerem quase todos os dias vítima dos mais variados problemas como malária, febre amarela, disenteria, doenças respiratórias, geralmente provocadas por gripes, entre outras. Michele era médica e tinha vindo ao Brasil fazer uma especialização no Rio de Janeiro, e terminou ficando por dois anos no Mato Grosso do Sul, para onde foi designada por um programa do governo federal. Voltara para França porque não tinha muito apoio e não suportou conviver com as pessoas morrendo em seus braços e ela sem poder fazer nada. Mas gostou de conversar com Richard e prometeram se encontrar novamente para conversar. Ela teve que ausentar-se pois ia atender um paciente no hospital onde estava trabalhando naquela tarde dando plantão.
Três anos depois, Richard chegava do colégio onde tinha sabido de sua aprovação no vestibular de medicina no Rio de Janeiro e, ao entrar em casa, sua mãe, seu pai e seu irmão lhe receberam na porta com um grande abraço. Já tinham tomado conhecimento do sucesso de Richard, pois Michele telefonara para casa do vizinho, para parabenizá-lo pela vitória e, como não o encontrou, contou à sua mãe sobre o resultado que tinha sabido pela internet.
Richard estudaria na mesma universidade em que Michele havia estudado, e consultou os pais, para pedir permissão para convidá-la para voltar pro Brasil, e morar com ele no Rio. Seus pais eram muito pobres, mas tinham guardado todas as economias nos últimos 18 anos para ajudarem Richard nos seus estudos. Estava na hora de retirar aquelas economias do banco. Ele passaria a viver num mundo novo, desconhecido, cheio de incertezas mas com seu amor ao lado.
Alberto Valença Lima
Enviado por Alberto Valença Lima em 11/03/2018